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April 10, 2020

Quarentena



                                                         



- Saiam da rua! O corre-corre acabou. Gritou a mãe na porta de casa. As crianças avançaram se atropelando e rindo, pois até na recolhida havia modos de brincar. O trabalho da mãe também se encerrara quando a loja do shopping fechou as portas devido ao novo vírus ameaçador. O pai ainda trabalhava de frentista no posto de combustível e trazia as novidades da rua.
Dias diferentes, de recolhimento e prevenção frente à ameaça invisível. Situações concretas que desencadeavam outros episódios: o descanso mental frente à vida de sacrifício de muitos ao tédio dos idosos de não possuírem mais o livre caminhar de outrora. A possibilidade das boas conversas familiares de alguns à confrontação, de outros, com a convivência integral com os entes. A incerteza do salário em dia à frustração daqueles que geram renda através de seus negócios.
Os pormenores da vida foram se amontoando como detalhes em uma partida de quebra-cabeças e as peças que se encaixavam se mostravam cada vez mais desafiantes, complexas para só depois revelarem outras facetas do jogo. A reclusão nas casas e apartamentos implicou um olhar de enfrentamento, não somente ao vírus, visto que as ações de prevenção deste eram todas de ordem didática.
Nos lares, a ordem eletrônica da internet e TV disseminava o vírus e seu trajeto de medo e perdas. Enquanto conceitos de estruturas mais profundas como religião, cultura e partidarismos se acirravam dividindo o consciente coletivo; a economia, volátil, adoecia ou se recuperava a uma ligeira mudança do avanço virótico.

Decerto, havia outros patógenos a enfrentar, tanto sociais quanto particulares. Havia outras quarentenas a se praticar, além daquela que leva somente o corpo para a casa. Seria hora de não nos paralisarmos frente à mão invisível do medo e refletirmos amiúde sobre a vida, o outro, o planeta. Entrem! O corre-corre acabou.

Lepcam 

08/04/2020

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